domingo, 28 de abril de 2013

Marcelino



Marcelino era um garoto assim
Daqueles que brincam, que sempre correm no jardim
Marcelino vivia a sonhar
Com o dia em que abriria os braços
E magicamente poderia voar
Andava em meio as ruas de sua cidade
Com a cabeça longe, em outra realidade
Era engraçado vê-lo dizer
Coisas que alguém realista
Jamais ousaria querer
Escolhia a dedo quem seriam seus irmãos
Pois era de falar pouco, não gostava de termos vãos
Pintava e construía meio sem querer
Andava e via o que poderia fazer
Gostava sempre de vir a semear
Em campos ditos perdidos
Para onde ninguém mais dirigia o olhar
De tanto sonhar começou a crer
Ainda que muitos lhe dissessem:
"Não se deixe enlouquecer"
Com o pensamento passou a edificar
Seu balão mágico, de onde partiria a viajar
Via os morros como meio caminho até chegar
Nos campos verdes que aspirava admirar
"Sonha, Marcelino" era o que ele ouvia dizer
Uma voz doce, que lhe fazia enternecer
Ante o canto do galo ao raiar
Marcelino foi, e começou a trabalhar
Sempre olhando para cima, pensava consigo
"O que devo faço agora, o resto é contigo"
E na sua certeza inabalável, um dia seu balão ficou pronto
Marcelino sonhou, construiu, zarpou
Ao sabor dos ventos, que além do oceano o levou
Pois sabia o que muitos continuam a ignorar
Que no vento existe uma voz
Que nos mostra para onde andar
Descendo em terra, continuou a prosseguir
Sem esquecer, porém, de onde o vento o fez subir

sábado, 27 de abril de 2013

Narciso

"Estou preso em meio a um labirinto cheio de espelhos
O meu mundo gira em torno das vontades que eu tenho
Estou imerso em um sistema que me diz você é livre
Mas no fundo o desejo pela liberdade não cessou
Que eu sou escravo do consumo desse amor por mim
Eu sou escravo sem saber que sou assim
Que eu sou escravo do consumo desse amor por mim
Eu sou escravo sem saber..."

O que somos? Meras páginas de um livro, que conta a história de uma sociedade? Será que podemos nos resumir ao que temos, o que queremos ter, e que o que lamentamos não ter mais? A vida como ela é hoje mostra que precisamos de sempre estarmos acompanhando as últimas tendências, para sermos. Senão, somos parte da história, do passado. Somos páginas rotas e amassadas. Porque do ontem, ninguém mais quer saber. Talvez seja um medo incontido e disfarçado de encarar os erros que repetimos todos os dias, embora invetemos sempre novas formas de cometê-los.
Todo ser humano possui uma certa tendência em desviar o foco de sua atenção para si mesmo. E há quem saiba e se aproveite disso. Não há prisão mais eficaz que fazer alguém apaixonar-se por uma imagem no espelho, ainda que ela seja falsa. Criá-la, recriá-la, fazer com que seja o que queremos ser, embora nunca seja algo alcançável. Imagens no espelho são virtuais, e aí mora a genialidade da ideia. Desesperados cada vez mais em alcançar aquele paraíso virtual, as pessoas consomem, e consomem, e consomem...
No fim, surgem complexos, distúrbios e, ao perceber a própria incapacidade de se ser perfeito, o "eu" se nega. Se recusa a se ver, e toda a sua vontade passa a ser não existir. Aquela liberdade efêmera se desmancha qual pó, por não ser nada mais que uma ilusão mercantil, com o fim de manter um mercado escroto de desejos passageiros. E quando o consumidor se cansa, ele já não serve mais. É artigo fora de moda, fora de linha. E surgem novas tendências, novas "tribos", novos estilos... Novos rótulos para o mesmo produto, que só visa explorar um Narciso decadente, que se renova a cada nova alma que cai perdida no espelho do mundo materialista.
E assim, dia após dia, geração após geração, o ciclo se renova. Porque não encontrando amor nos outros, exacerba-se o amor próprio, e o que é uma tentativa de seguir adiante se torna um distúrbio doentio de auto-aceitação. Triste parte da condição humana, que ainda se apega ao que transparece por fora do corpo, esquecendo que as verdadeiras janelas do corpo são coisas mais simples, que podem ser vistas apenas por um olhar.

quarta-feira, 24 de abril de 2013

Sobre viver



Quem disse que a vida era assim?
Um mar repleto de caminhos sem fim
Quem disse que era natural alcançar?
Um lugar onde ninguém de você possa se lembrar
Por mais estranho que possa parecer
Nem sempre é belo ver o sol nascer
Quando a nostalgia está no ar
E sente-se ela nos pulmões
Entrando em teu corpo apenas por estar a respirar
Lar, doce lugar
Cantigas de roda, crianças a brincar
Soa perfeito o desejo de ter
Alguém para contigo, ir nos campos correr
Lá no alto da montanha
Você poderá sempre ver 
O mundo inteiro à sua volta
O horizonte subir e descer
Mas de nada basta um momento para olhar
Se no pensamento não há ninguém para se lembrar
O que faz bela uma visão
Não é seu sentido, sequer sua razão
É a certeza de ali haver, um motivo para mais adiante correr
Dia após dia para sempre buscar
Caminhos nessa estrada
Sem se deixar abalar
E apesar das idas e vindas
Saber que ao longo de todas essas andanças
Jamais seremos mais do que apenas meras crianças

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Sobre idas e vindas




"And I've had recurring nightmares
I was loved for who I am
And missed the opportunity
To be a better man"

E a vida segue. Dia após dia, nossas escolhas definem os passos que teremos de dar nos dias vindouros, apenas reflexo de nossa própria imagem, qual reflexo em um lago calmo, que só se perturba quando atiramos pedras em sua superfície. Sempre temos a opção de nos deixar levar, ou nos levarmos. Mas, acima de tudo, com quem estaremos. Certamente, mais importante que chegar lá, é o como e com quem, pois são essas duas coisas que dizem tudo sobre o nosso caráter. 
Sempre temos a chance de recomeçar. A vida recomeça sempre seus próprios ciclos, alguns mais longos, outros nem tanto. E, da mesma forma, todos nós podemos redefinir nossos passos, e dar uma nova direção para nossa caminhada. Basta sermos humildes o bastante para admitirmos que erramos, e sinceros de coração ao procurar aqueles que nos amam, pois nunca ninguém estará completamente sozinho nesta vida. 
Todos erramos, todos chateamos, somos chateados, mas uma única coisa pode sarar isso tudo: o perdão. Perdoar a si mesmo, ao outro, e buscar construir um novo tempo, porque o que é passado, o tempo apaga. A menos que nós mesmos continuemos a construir os mesmos castelos de orgulho, egoísmo e dissabor... Porque a tendência natural da vida é ir de encontro ao amplo mar da comunhão, comunhão esta que não se faz com mentira nem mágoa, mas apenas com o amor de saber que o erro é apenas uma estação temporária rumo à perfeição. 

quinta-feira, 4 de abril de 2013

Gerais



Café, broa de fubá
Quindim, canto de sabiá
Fogão a lenha, estalo da madeira
Histórias que se ouve
Sentado ao pé de uma cadeira
Risos, crianças a correr
E no pomar, a jabuticaba a amadurecer
Carro de boi que vem a cantar
Cantigas antigas, que só os avós conseguem lembrar
Cheiro de mato, o sol a brilhar
Gotas de água, durante a noite esteve a orvalhar
Barro mole, roupa vermelha
Assim se diverte uma criança pentelha 
Leite vaca, ainda a espumar
Doces da roça, não se faz em outro lugar
Palavras simples, que a qualquer um podem encantar
Jeito modesto, e casa acolhedora
"Tome só um cafézinho", é sempre o que diz a alma aberta
Dia após dia, vida sofrida
Sonhos perdidos de uma alma constrangida
Fé que não se abala, embora o futuro seja incerto
Olhos que se fecham, apenas para sentir o horizonte mais perto
Pois dos cantos daqui para o céu se erguem
São feitos com a certeza de que eles nunca se perdem

quarta-feira, 3 de abril de 2013

De quem é a culpa?



A vida inteira sempre fiz parte de uma sociedade ímpar. Nosso país tem uma singularidade que o torna bastante especial. Somos o fruto de uma mistura, uma miscigenação de culturas. Cresci em meio à transição do Brasil devedor ao Brasil credor. Da falta de oportunidades de estudo, às bolsas para universitários no exterior. Presenciei, ainda que não tivesse a devida maturidade, a denúncia de inúmeros casos de corrupção, ataques entre partidos, e por aí vai. Assisti e participei da eleição da primeira mulher presidente do Brasil. Vejo todos os dias pessoas que se queixam das condições de vida, de como a política é levada por nossos representantes...
Mas no final das contas, quem é o culpado? Quem é a maioria, o povo ou os governantes? Mais que isso, quem são os insatisfeitos? Porque quem está por cima não tem motivos para olhar para baixo, a não ser que seja uma pessoa com sensibilidade humana, o que não é nem uma qualidade, e sim, um dever. Mas, no final das contas, quem elege? Quem usa os hospitais, quem é que vê a realidade assim como ela é? Apesar de o governo ser quem muda as leis, quem direciona o dinheiro para este ou aquele setor, é o povo que utiliza. Se nós não reclamarmos, ninguém muda. Porque enquanto nós não demonstrarmos nossa insatisfação, eles continuarão achando que está tudo bem.
Quem nasce rico não sabe o que é ser pobre, e quem nasce pobre não sabe o que é ser rico. São mundos diferentes, que quase sempre se relacionam conflituosamente. Mas cabe a nós fazer ess contato, porque somos nós que estamos nele. Enquanto sentirmos que alguém está nos excluindo, temos que nos manifestar. A vida é assim, ninguém vai fazer nada por você, principalmente quando a situação vigente é cômoda para ser mantida. 
Muitos falam da vida nos países ditos ricos, mas até eles exploram alguém. Basta estudar uma ou duas páginas de história. E se a população vive bem, é porque quando querem tirar o que é dela, eles vão às ruas, protestam, fazem-se ouvir. Enquanto não nos vermos como cidadãos, não seremos tratados como tal. Seremos mal educados, assaltados, extorquidos, enganados... Porque nós mesmos fazemos isso uns com os outros. A nossa mentalidade é, infelizmente, de nos darmos bem a qualquer custo. Ou por qual outro motivo todo o mundo conheceria o jeitinho brasileiro? Se queremos que nosso país mude, somos nós que devemos educar nossos filhos, parar de engolir tanta bobagem midiática e dizermos primeiro para nós mesmos que temos nossos direitos e deveres. Cumprindo os últimos, poderemos clamar por todos os direitos que nos são privados. Mas isso, só depois que pararmos de nos ver como sendo apenas o país que não vai pra frente, porque o outro não faz a parte dele. O outro nada mais é do que uma extensão de nós mesmos, pois todos fazemos parte de um só corpo, quer vejamos isso, ou não.