sábado, 27 de abril de 2013

Narciso

"Estou preso em meio a um labirinto cheio de espelhos
O meu mundo gira em torno das vontades que eu tenho
Estou imerso em um sistema que me diz você é livre
Mas no fundo o desejo pela liberdade não cessou
Que eu sou escravo do consumo desse amor por mim
Eu sou escravo sem saber que sou assim
Que eu sou escravo do consumo desse amor por mim
Eu sou escravo sem saber..."

O que somos? Meras páginas de um livro, que conta a história de uma sociedade? Será que podemos nos resumir ao que temos, o que queremos ter, e que o que lamentamos não ter mais? A vida como ela é hoje mostra que precisamos de sempre estarmos acompanhando as últimas tendências, para sermos. Senão, somos parte da história, do passado. Somos páginas rotas e amassadas. Porque do ontem, ninguém mais quer saber. Talvez seja um medo incontido e disfarçado de encarar os erros que repetimos todos os dias, embora invetemos sempre novas formas de cometê-los.
Todo ser humano possui uma certa tendência em desviar o foco de sua atenção para si mesmo. E há quem saiba e se aproveite disso. Não há prisão mais eficaz que fazer alguém apaixonar-se por uma imagem no espelho, ainda que ela seja falsa. Criá-la, recriá-la, fazer com que seja o que queremos ser, embora nunca seja algo alcançável. Imagens no espelho são virtuais, e aí mora a genialidade da ideia. Desesperados cada vez mais em alcançar aquele paraíso virtual, as pessoas consomem, e consomem, e consomem...
No fim, surgem complexos, distúrbios e, ao perceber a própria incapacidade de se ser perfeito, o "eu" se nega. Se recusa a se ver, e toda a sua vontade passa a ser não existir. Aquela liberdade efêmera se desmancha qual pó, por não ser nada mais que uma ilusão mercantil, com o fim de manter um mercado escroto de desejos passageiros. E quando o consumidor se cansa, ele já não serve mais. É artigo fora de moda, fora de linha. E surgem novas tendências, novas "tribos", novos estilos... Novos rótulos para o mesmo produto, que só visa explorar um Narciso decadente, que se renova a cada nova alma que cai perdida no espelho do mundo materialista.
E assim, dia após dia, geração após geração, o ciclo se renova. Porque não encontrando amor nos outros, exacerba-se o amor próprio, e o que é uma tentativa de seguir adiante se torna um distúrbio doentio de auto-aceitação. Triste parte da condição humana, que ainda se apega ao que transparece por fora do corpo, esquecendo que as verdadeiras janelas do corpo são coisas mais simples, que podem ser vistas apenas por um olhar.

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