domingo, 29 de dezembro de 2013

Descanso




Um dia calmo
Um lago tranquilo
Uma mente difusa
Mas um silêncio no espírito

Cartas na mesa
Jogo no fim
Um museu em chamas
Que dá adeus ao passado

Histórias na memória
Lições de vitória
A espada já na bainha
Soldados que voltam a ficar em linha

Fim de capítulo
O livro agora merece um título
Talvez venha um novo volume
Depois que com este final 
O leitor se acostume

Brisa no campo
No chão é que descanso
Existe um caminho
Onde antes os espinhos descansavam
Do outro lado cantam
Os corais da redenção
Num templo sagrado
Para onde só os que abrem mão de si vão

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Abraço


O som que reverbera
Esta é a hora para aquele que espera
Os tempos antigos hoje são apenas história
Uma lembrança meio viva
Mas que se torna nublada na memória

Já não maltratam aquele que vê
Ele já acredita novamente
Em tudo aquilo que ele pode ser
O mundo é uma bela canção
Para aqueles que têm luz no coração

Não importa onde quer que se esteja
Porque a vida está em todo lugar
Sinto ela pulsando dentro de mim
Me espanto com tamanho amor
Este cuidado que sinto em volta aqui

Um abraço terno
Uma palavra doce
Não é um sonho
Porque desde a manhã eu já posso ouvir
E nem posso conter essa chama de fogo vivo
Que queima tudo que há em mim
renovando cada parte de minh'alma

Nos pequenos detalhes é que eu te vi
E nas tão bobas coisas foi que ouvi
Um chamado de volta
A certeza de um amor inacabável
Que sem dúvidas vem abraçar
Cada pedaço de uma alma dantes quebrantada

E os ventos sopram bravos lá fora
Como sempre estiveram a soprar
Mas andando pelas ruas deste lugar
Vejo que é para isso que nasci
Ver e viver
E apesar de todas as folhas que caem mortas pelo chão
No grande dom da vida
É que jamais posso deixar de crer

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Dom Quixote




Era ele, um viajante solitário. Um acorde de base, uma voz grave de fundo da música. Era, ao seu ver, a peça secundária, aquela que não era vista. Era um preenchimento, daqueles que se coloca quando se sobra espaço. Não lutava mais por si, mas sim pelo que acreditava valer a pena.
Via no mundo o que queria queria que vissem nele. Via no mundo toda aquela bela construção, mas que por algum motivo não era vista em seus olhos. Olhos incomparáveis, por assim dizer. Como as águas verde-pérola das matas tranquilas, mas que são cheias de seus próprios segredos, pensamentos, histórias. Campos que só os que gostam de contato profundo e sincero sabem admirar, mas que podem dar a paz que todo viajante precisa.
Caminhava em suas próprias histórias, contos que ele mesmo tinha para si, e que não deviam pertencer a mais ninguém. Pelo menos não a quem não entendesse que lá no fundo, os moinhos inofensivos eram dragões temerosos e que, por trás de cada uma das suas batalhas, havia um dragão feroz a tentar devorar seus sonhos.Caminhava ele, em sua busca diária por um lugar de descanso, um descanso que ele ainda não encontrara em lugar algum.
Vivia em suas reflexões, e em seu silêncio atestava a sua certeza sobre o que deveria acreditar. Ainda que o mundo o chamasse de louco, ele tinha completa certeza de sua sanidade. E essa era a sua força, sua fé, sua vontade. Nem sempre os ventos do destino lhe sopraram a favor, mas sua espada jamais permaneceu na bainha quando ele sabia que ela teria seu valor ao ser estendida. Cada uma de suas batalhas era por uma das ditas causas perdidas, daquelas que não faz sentido algum dispôr-se a lutar. Porém, e isso era algo que somente ele via, estas eram justamente as únicas causas que um homem poderia ganhar nesta vida.


sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Presença


Em uma xícara de café
Naquela canção que surge aleatoriamente
Em uma fragância de perfume
Em estranhos nos quais vejo os mesmos costumes
Em olhares furtivos e distantes
Em países longínquos mas presentes
Na luz de uma lua prateada
No suspiro da brisa morna da manhã
Quando os pássaros da primavera cantam a nostalgia
Quando o silêncio da ausência é a única companhia
Quandos os sonhos tomam conta da mente adormecida
Quando o coração fala em voz alta e ensandecida
E a memória abre os porões empoeirados
No quebra-cabeça do destino humano
Nos muros de um futuro profano
Nas águas claras do mais belo oceano
No meu reflexo, eu, puro ser humano
Na quietude que me coloco
Nos espíritos antigos que em desespero invoco
Bem aqui em todo lugar
No nada, onde o bafo quente das chamas vem a soprar
Em ondas que fazem a pele arrepiar
Em uma tatuagem que não me lembro de em mim fixar
Em minha própria percepção
Nas linhas que estão escritas em minha mão
No meu subconsiente onde eu sequer posso ver
Sob a minha pele
E eu quase deixei de notar
Ainda aqui está você

terça-feira, 5 de novembro de 2013

Duplipensar



Todo dia uma notícia "bomba". Todo mundo comenta, se revolta, se alegra, vê motivos pra acreditar na humanidade, motivos pra achar que ela não tem salvação, e assim seguem os altos e baixos da sociedade virtual.
Se alguém pegar cinco minutos para ler os comentários nas notícias das principais redes de notícias, vai poder ver como as pessoas são contraditórias. Enquanto defendem que animais não podem ser usados em experimentos, defendem que presos deveriam, porque eles não têm nenhuma utilidade pra sociedade. 
Sem ver, são contraditórias. Sem ver, são hipócritas. Sem ver, enquanto tiram a faca de um ladrão, entregam a arma ao outro. E não percebem que, fazendo o que fazem, não fazem nada. Porque é exatamente isso que elas devem fazer: nada. A defesa da ação é feita com ardor na internet, enquanto são estigmatizadas todas as formas de protesto nas ruas. São arruaceiros, vândalos, gente que não tem o que fazer, e foi criada com muito leite Ninho em casa.
Não sou velho o bastante para dizer que isso é algo novo, e já aprendi que mesmo a história não é uma grande contadora de verdades. O que posso dizer é que, no pé que as coisas estão, não haverá um futuro muito diferente para as futuras gerações. Pessoas sequer sabem o que é uma ironia quando ela é utilizada. Reclamam da superficialidade do século XXI, mas sequer se dão ao trabalho de abrir uma reportagem, ao invés de ler apenas o cabeçalho do post no facebook.
Esse é o grande êxito do duplipensar. Combater a fome e comprando as queimas de estoque da Zara. Se erguendo contra as ostentação, e achar lindas as novelas das nove, e cair na balada ao som de um "Camaro Amarelo", para não dizer algo pior. Defenda o que é certo, mas critique quem luta por ele. Apenas seja um a mais que tem na timeline muitas orações, fotos legais, sorrisos estampados e, pra quebrar o gelo, o link de algum abuso de direitos humanos num país longínquo e distante. Por é sempre mais fácil amar as baleias caçadas no Japão.

terça-feira, 29 de outubro de 2013

Quando todas as luzes se vão



Naquele dia, o sol acordou sem cor. Sua luz não aquecia, e tudo era um preto e branco sem graça. Ao sair da cama, a água do chuveiro parece não existir. Tudo é só um mecânico agir, e o corpo já anda no piloto automático há anos. 

Porque não há mais graça, não há motivo. Porquê, afinal de contas, continuar? Ver as mesmas coisas todos os dias, as mesmas pessoas perdendo a oportunidade de se tornarem alguém melhor. Os próprios problemas parecem ter feito uma aliança macabra para conspirar contra a felicidade. Aliás, felicidade? Isso é uma utopia, que passou a ser engarrafada pra ser comprada por aqueles que podem ter suas doses diárias.

A natureza em si parece morta. Não há folhas, nem pássaros. Corvos, com aqueles gritos horrendos, como que a prenunciar uma tragédia inevitável, preenchem a paisagem. Um gélido frio, qual os olhares das pessoas em volta, parece espremer e fazer agonizar aquela pequena chama que ainda lutava pra se manter. E ela se apagou.

Saindo de casa, a lufada de ar. Passo a passo, embora sem sentir nenhum deles, se vai caminhando. Já não se repara que, abaixo na neve branca e indiferente, ainda existe vida. Ainda existe luta, resistência. Porque a chama dos olhos se apagou. Em verdade, o que se é, já se foi, e a mente anda em vales sombrios, para os quais agora quer se dirigir.

Então, numa ideia que já vinha crescendo no íntimo, surge a coragem. Surge a certeza. A despeito de todo o mistério, a incerteza, ao menos se sabe de uma coisa: pode ser o fim. Sim, é o fim. Então toda essa tortura desnecessária poderá ser deixada de lado. Abraçando a noite, que hoje não terá lua ou estrelas. O preto, que agora é um bom amigo, vem para cobrir com o manto do esquecimento. Uma freada repentina, um baque surdo, e tudo então está acabado. Entre lágrimas e estarrecimento, tudo se desvanesce.
"Olá, abismo. Hoje eu me entreguei a você."

sábado, 26 de outubro de 2013

Dança


Em cada passo, um olhar furtivo
Giro, volta, ida, e um rodopio louco de paixão
Pés que conversam, cantam, se apaixonam
Mãos que se guiam, se encontram, permanecem
Um ritmo que domina os olhos cheio de vida e fogo
Numa batida que eleva os ritmos de um alegre coração

Um universo que existe no ir e vir dentro da canção
Prendendo-se, libertando-se, 
E mostrando que ainda assim se quer ficar
Um frenesi, uma fornalha ardente que consome carne e sangue
Já não são dois, e sim um que se estende em duas metades
Venham e mostrem dos que são capazes

Mostrem que a vida é mais que o ir e vir insano pelas ruas de uma cidade solitária
Mostrem que o amor está na dança a dois, onde a sintonia impera
Reinem em sua própria criação
Sem palavras, sem ações
Apenas movimentos que surgem de dentro de uma alma que mostra suas cores

Façam-se sentir, façam-se ouvir
Caiam em uma subida que irá transcender este mundo
Joguem com a música, ela foi feita para ser vivida
Brinquem com a união, ela é para que se sinta o prazer
Prazer de estar ali, enquanto o resto do mundo está parado perante seus passos
E continue apenas a ouvir o som da canção
Que coordena dentro de ti essa poderosa emoção

Tragam para o visível aquilo que só o metafísico tem
Mostrem que muito além do material
Há o mundo real
Vivam, não apenas existam
Sejam obra de arte, não de engenharia
Sejam dois seres a pulsar vida
Qual um par de estrelas no espaço
Dançando eternamente
Enquanto cada nota toca no ar
Caiam em si, saiam e voltem aqui
Porque espíritos livres é que são
Encontram seu caminho juntos
No universo que se escontra dentro daquela canção

sábado, 19 de outubro de 2013

Fácil


É muito dizer continue a andar
Sem jamais apontar uma direção
É muito fácil cantar a grande fúria
Quando o camarote está longe da penúria 
É muito fácil falar de errado e culpa
Fazer do perdão uma mera ilusão
Soa tão fácil alcançar a santidade
Quando para além dos muros se expulsa a realidade
É muito fácil procurar a felicidade
Renovando em si a ludibridez de uma essência tão profana
E é muito fácil falar de escolhas e punições 
Quando não se está na pele de quem não tem mais opções
Seguindo o caminho perfeito dessa insanidade
Discurso lindo, uma prática tão cruel
Mate aos poucos aquele que não ama
Quem por uma ajuda, todos os dias é que clama
Porque é muito fácil falar em guerra santa
Quando os demônios se escondem nos canhões
O terror não está só em um lado
Ele está na face de todo aquele que é atacado 
Crianças pobres, já não têm mais cama
E agora a mãe só consola na memória 
Qual a foto triste que entra para a história 



terça-feira, 8 de outubro de 2013

Crenças

"Agora, pois, permanecem três coisas: 
a fé, a esperança e o amor; 
mas o maior destes é o amor." 
Coríntios 13: 13

  
Acreditar. Ver no futuro uma chance de haver luz. Estar certo de que, apesar de tudo, existe um bem maior. Algo, o que quer que seja, pelo que se vale a pena lutar. Vemos todos sócias pessoas que enfrentam duras provações, só para chegar até onde elas acreditam ser possível. A fé move montanhas, e a esperança nos faz seguir adiante pelos caminhos que se abrem quando estas se vão. 
Porém, existe algo que dá sentido a isso tudo. Não basta apenas acreditar, e seguir com uma chama dentro do peito. De nada adianta, soltar palavras ao vento, quando não se quer realmente chegar ao outro, e sim a uma confirmação do que acreditamos ser certo. De nada adianta, se tudo que fizermos, for em prol de algo que apenas nós vemos como possível. Os egoístas e orgulhosos também fazem isso, porque não vêem que a sua luz é fonte de sombras para os outros. 
Enquanto tudo o que buscarmos for em prol daquilo que temos dentro de nós, estaremos apenas querendo mudar o mundo à nossa maneira. Estaremos apenas querendo transformar cada pessoa deste planeta, em uma obra de nossa fé. É a nossa esperança será não em um mundo melhor, mas em um mundo que reflita aquilo que somos. Todos precisamos ter nossas crenças, nossas certezas, nossa solidez. Mas essa solidez não pode ser a fonte de dor para o outro. Muito pelo contrário. Porque "ainda que saibamos a língua dos anjos, sem amor, nada seríamos". Enquanto continuarmos a ver os outros, o que eles têm para si como obstáculos, seremos apenas uma fonte a mais de violência. Seja ela verbal, física, psicológica... Não creio que eu seja nenhum grande sábio, tampouco um mestre. Mas acredito, e podem até me chamar de louco por isso, que nada nessa vida vale a pena ser feito, se não for feito com amor. Porque só ele é capaz de edificar aquilo que fazemos em uma obra sagrada. Só ele, no fim das contas, nos faz ver quem realmente são os outros. Eles são nada mais que aqueles pelos quais devíamos viver. Nem todos se lembram disso, mas ainda acredito que haja luz suficiente, para não deixar que tudo se torne trevas. Do contrário, já não haveria mais esperança. E a minha, tenho de confessar, é o amor sincero e puro que cada um de nós é capaz de sentir.  

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Arranha-céus




Vivemos sempre em busca de coisas grandiosas. Começa com notas boas, uma bom desempenho no vestibular, uma faculdade bem conceituada, um emprego que nos traga um bom salário... Sempre somos levados a buscar o mais, a querer estar no lugar número um.
Nesse meio tempo, construímos grandes alicerces para nossas vidas. Estruturas que suportam arranha-céus gigantescos de obras ao longo da vida. Castelos de pedra que são verdadeiras fortalezas contra o mundo. Mas então, de repente, começa a surgir aquele pequeno sentimento de que há algo errado. Como poderia haver algo errado, se deu tudo certo? A verdade é que, na busca que somos levados a empenhar, muitas vezes deixamos de sermos nós mesmos, para sermos nada mais que o número um.
Tudo acontece cada dia mais rápido. A adaptação tem de ser quase que instantânea, como um dispositivo USB, que se pluga à nova estação de trabalho e começa a funcionar. Não temos nada mais que esqueletos de obras colecionadas ao longo de nossa existência.
Daí surge esse sentimento de insatisfação, desânimo, solidão. Passamos tanto tempo pensando no que seria grandioso para realizarmos, algo que o mundo veja como incrível, que deixamos de ver os nossos pequenos detalhes cotidianos. Comer com calma, ouvir uma música, assistir a um filme, ou qualquer outra daquelas pequenas coisas que nos façam sentir que estamos sendo mais nós. Em um mundo onde cada vez mais se pede pela padronização do indivíduo, essa talvez seja a diferença que faz com que uns vivam, e outros apenas existam. Construir grandes obras, qualquer um faz. Mas deixar seu próprio espirito marcado nos detalhes desenhados em formas e cores é algo que só mesmo os gênios conseguem fazer.

terça-feira, 10 de setembro de 2013

Distância





Família, amigos, chegados. Colegas de classe, companheiros de provas, apenas meros conhecidos de vista. Na vida encontramos todo tipo de pessoas. Aquele que sempre quer saber o que você está fazendo, aquele que espera você chegar para contar, aquele que parece não estar muito antenado, mas do nada te surpreende por saber tudo sobre você, e ainda te divertir com as piadas bem sacadas que sabe fazer. Aquele que simplesmente fica calado, com um olhar observador, e sempre tem um comentário pertinente. 
Ou ainda aquele que você já conhece tão bem que telepatia deixa de ser ficção científica. Um olhar basta. Em contrapartida, existem os com as mentes escondidas, que parecem ter uma intenção, e só depois revelam seus intentos. Um olhar furtivo, e outros tantos ignorados sinais que só fazem sentido depois do fim.
Seja lá como for, encontramos sempre pessoas que deixam suas marcas. E outras que não deixam marcas, porque elas não se vão. Elas simplesmente ficam, aquecendo nosso frágil espírito nas noites solitárias. A distância não é algo que se meça em metros, quilômetros, sequer anos-luz. A distância é medida em sinceridade, em companheirismo, em fidelidade. Há muitos que estão longe mas estão perto, ao passo que os que estão perto estão longe. 
Quando se está na estrada, tudo fica mais claro. Os apegados irão querer te reter onde eles estão. Os falsos tentarão fazer com que você siga suas mentiras, pois para eles é pura verdade. Mas os que estarão contigo, sem que ninguém mais veja, estes são os que te amam. A verdadeira presença não se vê. Ela está em pensamento, em espírito, e apenas se sente. Numa tarde de sol, ou em um amanhecer ensolarado. Em um dia de neve, ou no meio da chuva. Andando de bicicleta pela floresta, viajando de ônibus num país desconhecido. Nas praias de um mar distante, ou até mesmo no show daquela banda que só você gosta. 
Aqueles que te amam estarão nestes momentos. Porque eles se encontram onde mora a sua felicidade. E, nos momentos de tristeza, suas vozes soarão como o canto dos anjos nos céus, a orar e trazer o conforto sagrado, o qual só vem das intenções sinceras de coração. "Estou com saudade" é algo fácil de dizer, e muitos farão isso. Mas é, possivelmente, um dos sentimentos mais difíceis de se sentir e, em geral, ela só é encontrada nos corações daqueles que quase nunca pronunciam uma palavra.

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Formas e cores



Dizem que nascemos para crescer, ter uma família, sermos felizes. Concretizar planos, que alguns crêem ser nossos, outros crêem serem planos já estabelecidos antes de nossa própria existência. Cada um com sua crença, sua própria visão de mundo. Mas que, no final das contas, só se mostram como sendo diferentes formas de chegar ao mesmo local.
A despeito de tudo que se creia, de tudo que se tenha como certo. Existe um universo inteiro de coisas que não sabemos, tão infinito quanto nossa própria imaginação. Ainda assim, muitos montam seus próprios castelos de dogmas e, em redor deles, muralhas de certezas ásperas como pedra desgastada, que rejeitam qualquer viajante que passa por aquelas paragens.
Aos poucos, é possível ver como tudo é construído dessa forma. Quando pessoas erguem seus castelos uns pertos dos outros e de forma igual, unem-se em ligas chamadas sociedades, abrindo campanhas de extermínio umas contras as outras. O que importa é a própria verdade absoluta de cada um. Ao se fecharem nas suas fortalezas, não deixam apenas de ver o mundo. Não deixam, também, que o mundo as veja.
O medo de se mostrar, ser o próprio eu, toma conta de todo o espírito. Porque ele deve se encaixar e, mais que isso, fazer com que o mundo se encaixe à sua maneira. Não interessa se a peça é quadrada e o buraco redondo, ela há de passar, porque alguém disse que era assim. Não interessa se é feito de carne e sangue o alvo do outro lado da muralha. Ele tem de morrer.
Assim segue a humanidade. Porque nos achamos donos da verdade o suficiente para definir que o outro não deve existir por ser um mal ao mundo. E assim mudamos suas ideias, desconstruímos suas culturas, moldando-os incessantemente à forma perfeita de ser. Não nos perguntamos onde é que está o livre-arbítrio ao qual todos temos direito. Não sabemos respeitar quem simplesmente não consegue ser igual aos nossos tolos pensamentos. Apenas deve ser. Mais que isso, agimos com uma loucura desenfreada, de quem vê à frente não mais um indivíduo, e sim um território a conquistar.
Apenas nos esquecemos que almas e corpos são donos de si, e não uma propriedade desocupada que devemos apropriar. Talvez, torço eu, um dia ainda consigamos aprender isso.

terça-feira, 27 de agosto de 2013

Inominável


Caminhar, batalhar. Enfrentar a cada dia os grandes desafios da vida. Entender que haverão sempre desafios por vir, obstáculos a superar, decepções que irão nos fazer pensar que o dia de amanhã nunca vai chegar. Tudo isso é viver.
Muitas vezes é preciso engolir o choro, e amadurecer. Entender que a dor faz parte da vida, e não é o fim do mundo encarar o que está em redor como sendo uma forma a mais de crescer. É para isso que estamos aqui, para sermos um pouquinho melhor do que aquilo que já somos.
Crescendo em ciclos, que se iniciam, se fazem sólidos e se fecham, chegamos sempre a novos rumos, novos lugares que nos surpreendem por nos mostrar até onde ainda teremos de ir. Poucos prazeres são tão profundos quanto o de descobrir o quanto a vida pode ser profunda, naquelas pequenas coisas que nos fazem sentir completos.
Errar, descobrir onde estão nossas falhas. Descobrir que a pessoa mais difícil de se perdoar é a si mesmo. Tudo isso faz, junto com todas as outras coisas que nos tiram arrepios da pele, nos sentirmos até o último fio de cabelo, completamente vivos. A vida está no movimento, na descoberta, no olhar que brilha diante do que se vislumbra. nas lágrimas que caem na calada da noite, nas despedidas que fazem com que saibamos o quanto amamos aquele que parte.
No final das contas, é em cada expressão de sentimento que encontramos a verdadeira forma de nosso ser. Quando amamos, quando entregamos tudo de nós por alguém em quem vemos uma razão de nos movermos. Por isso constroem mundos as mães, e destroem montanhas os pais. Por isso controem novos horizontes os filhos, e sonham novos universos os apaixonados. Porque o que vale na vida é ter um sentido para o que se faz, para o que se sonha, para o que se busca. É tudo isso, em suas pequenas efemeridades, que nos faz sentir no sangue o que significa a palavra existir. Essa experiência única, mas intensa em si só, para a qual simplesmente não foi encontrada nenhuma palavra para nomear.

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Esperança



Acomodar. Insistir nos mesmos erros, ou simplesmente parar, olhando para o tempo que se perdeu. Esperar pelo milagre da mudança, que chegará apenas quando um agente externo vier e mudar completamente a própria vida, vida esta que foi construída com nossas escolhas, nossos passos. Escolher sempre um novo culpado imediato, cujas máscaras vestimos para não nos vermos como responsáveis no espelho da consciência.
Acusar. Guardar dentro de si aquelas farpas espinhosas que sangram a alma, lembrando dos dias em que fomos feridos, como que ainda a nos colocar como vítimas do destino. Afinal de contas, qual o grau de inocência em quem prolonga o próprio sofrimento apenas para poder receber palavras de consolo daqueles que não enxergam a demência de uma carência desmedida?
Antes, sacuda a poeira e volte a caminhar. Justiça é algo que ainda não temos clareza de visão para exigir. E ela não tardará a chegar. Mas temos uma vida para viver, uma história a construir, um propósito a cumprir. Sempre seremos feridos, haverão aqueles que chegarão para deixar como marca apenas uma triste cicatriz, lembrança de um destino doloroso que envolvia os protagonistas de uma crueldade expressa em rancor egoísmo e orgulho.
Mas há sempre novos dias para existir, novos lugares para conhecer, novas músicas para ouvir. Novos amigos para conhecer, e também novas lições para aprender. As velhas histórias terão seu tempo de serem lembradas, mas não seremos nós quem decidiremos quando. É algo muito mais além do que conseguimos perceber, e vai além das distâncias longínquas que estão entre as estrelas do universo da alma humana. Caminhar pelas paragens da existência é um exercício contínuo de perdão e reconstrução daquilo que somos. Tudo isso antes do final, que embora não saibamos qual será, traz a promessa de ser algo bom.


quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Folhas ao vento



Era eu, era teu
Era meu, o tempo corroeu
Qual fotos antigas
Assim são apenas memórias
Quebradas, sem nexo, perdidas
Já não quero mais lembrar
Dessas tantas dores vividas
Um olhar que se foi
Um toque que se esvai
E nas noites gélidas das lembranças vazias
Finjo me encantar com cada nova paisagem
Quando nesta vida dobro as esquinas

Caminhei para frente olhando pra trás
Não vi sombra, não vi luz
Apenas um vazio, que mais à frente ainda me conduz
Árvores de inverno, sem vida, sem flor
Uma paisagem em minha mente
Que é o desenho desta dor
Cores de uma música que se repete
E se faz mais intensa a cada nota
Sinfonia da saudade
Para onde você foi?
Me pergunto, em verdade
Nessa brincadeira de seguir
Páro, olho, não há nada aqui

Folhas no chão já cheio de neve
O frio enche, sinto ele abaixo de minha pele
O olhar que tinha um brilho
Agora pisca quando pensa poder prosseguir
Vez por outra ainda me lembro
Daquele último novembro
Planos divertidos de de lá do fundo do coração
O futuro era um amigo
E sonhar não era em vão

Onde foi toda a verdade?
Viver para sentir
Eis a minha intensa liberdade
Um céu negro
Sem estrelas ou nuvens
Pois todas elas caíram
Tentando realizar meus anseios agora fúnebres
Abalou-se a terra, fenderam-se os oceanos
Partiu este mundo
O chão despediu-se dos meus pés
Flutuando em outra dimensão
Contemplando as eras que se vão
Errante que agora sou
A mim mesmo eu estendo a mão
Girando num balé cósmico
Qual naquela música que tocava
Enquanto você executava seu mais cruel propósito

Façanhas da humanidade
Falas bonitas, com muitas meias verdades
Ainda não me perdi
Daquilo que me lembra da amada santidade
Notas tranquilas de uma música que me compõe
Pausa, sons, orquestra, flauta
Em uma estranha harmonia tudo aqui agora se dispõe

Falsetes belos a cantar em outra língua

Aquilo que já não tenho alma mais para dizer nesta vida
Pedaços de mim que se dissolvem pelo ar
Aos poucos me vou, talvez seja para isso que aqui estou
Como as árvores que vejo, e que perdem suas folhas
Me esvaindo estou, a me juntar a esta bela natureza
Ouça atento quando o vento vier lhe abraçar
Serei eu ao seu lado, como eu sempre quis estar

sábado, 10 de agosto de 2013

Realidade Virtual



Sou o que vejo? Ou sou o que sinto?
Estranho que se tocam, se falam, se excluem
Será esta paisagem a nossa verdade?
Ou apenas arquitetura e estética?
Será que ainda sou natural?
Ou já me esqueci de que também sou animal
Sintéticos, aditivos, conservantes
Caem em mim chovendo a genialidade
De quem apenas não quer admitir
A sua própria monstruosidade
Nas voltas do mundo permaneço aqui
Nessa estranha morosidade
Olhando um sol elétrico que ilumina uma trilha feita para mim
Mas que eu não sei se quero, porque no fundo eu sei que não sou assim

Viajo nas ondas desta existência confusa
Ruído cósmico a me lembrar do tamanho do meu umbigo
Prateleiras de ofertas para ser feliz
Mas nenhuma delas traz a única coisa que eu sempre quis
Serei um eterno insatisfeito?
Ou apenas mais um pobre aprendiz?
Crendo que cada passo é um avanço à frente
Mas sem saber o que, no final, trará a conrrente
Confiando apenas no que se sente
Porque a razão é loucura,  uma loucura que vende e mata

 Luta, invasão, repressão
Até quando não veremos onde é que está o nosso irmão?
Mas já não importa, porque etiquetaram a realidade
E só a compreende quem paga pelo cinema
Porque o novo deus dinheiro não é piedoso
E nem tem misericórdia
Só tem ganância, e apenas quer adoração
Se mate por ele, e talvez ele lhe poupe um pouco mais de vida
Vida no iate, na costa das praias compradas
Onde jazem os restos
De uma natureza que foi desarmada

Mas ignore tudo isso
É peso demais para tão pouca consciência
Que caindo sobre todos nós
Esmagaria nossas faces na vergonha
A prepotência do controle absoluto
O abandono daquilo que não é mais que um minuto
Faça valer cada centavo
Porque nos cofres largos da atualidade
Não cabem pensamentos, apenas vontades
Que se vendem, prostituem-se com suas próprias imoralidades
Enquanto uns morrem a ver as maravilhas da TV
Perecem nos campos aqueles que lutam por aquilo que há muito já não se vê

quinta-feira, 25 de julho de 2013

Sobre necessidades e milagres com rótulos


Acordou e sentiu de novo aquele mesmo desejo. Foi até a geladeira, pegou uma garrafa com um líquido negro, que não tem sabor de nada conhecido, e bebeu. Ahhhh! Ops. A vontade continuou. Bebeu mais, até o fim, mas não adiantava. Decepcionado, resolveu ligar a televisão. Lá viu a promessa de um produto que poderia satisfazer o seu desejo. Ótimo! Tudo que ele precisava. Pegou as chaves em cima da mesa, e partiu com o carro. Foi até o mercado mais próximo, e lá estava a promessa. Comprou e, logo que saiu, bebeu todo o conteúdo. Algo meio gasoso, com gosto e sem gosto, que nem de longe era o que ele procurava. Será que havia algo errado com ele? Pois parecia tão perfeito na TV...
Então, andando pela rua, topou com uma mulher, atraente em roupas chamativas, que tinha em mãos uma garrafa. Bebeu, sentiu o corpo despertar dos pés à cabeça, e sentiu que tinha energia para o dia todo. Isso sim era bom. Era da moda, inclusive. Se sentiu jovem, descontraído. E logo veio a vontade de mais, porque descobriu que seu desejo nem de longe tinha sido satisfeito.
Ficou irritado, e o corpo pedindo cada vez mais. Puxando a gola da camisa, pensou em como estava quente. "Que dias difíceis", pensou. "Já não se encontra nada com qualidade." Continuou na sua jornada, sempre encontrando mais explicações para seu desejo, cada vez mais bem elaboradas. Em uma delas, inclusive, ele devia ter algum distúrbio no organismo, e lhe propuseram um milagre engarrafado para lhe ajudar. Mas ele preferiu continuar caminhando.
Então, ao meio do dia, sentado na praça, ele a viu à sua frente. Barulhenta, brilhante, aos montes se espalhando dentro do grandioso recipiente de concreto. Foi até e provou. A não presença de sabor, o toque gelado, fez seu corpo enviar reflexos de descanso e satisfação. Naquele momento ele viu que não era falta de energia, tampouco um distúrbio. Era apenas, pura e simplesmente, sede. Sentindo-se ao mesmo tempo bobo e aliviado, sentou-se no banco à sombra, a aproveitar o dia que, como ele sentiu pela brisa que vinha das árvores, na verdade não estava tão quente assim.

sábado, 20 de julho de 2013

Leve brisa da manhã



Quem disse que o peso era assim?
Que os dias sempre terminam com um stresse sem fim?
Quem disse que não se deve gozar
Dos momentos à tarde, sentado a descansar?

Quem disse que a vida é tão dura quando o chão
Que os dias dela, quase sem vermos é que se irão?
Quem disse que o sol é para queimar
As costas daquelas almas que não podem deixar de trabalhar?

Pois todos devem saber
Como é bom sentir o vento do entardecer
Acordar de manhã e cantar
Pela janela um novo dia que está a começar

Sentir o sabor daquilo que se come
Saber do passageiro ao lado no ônibus
Apenas o seu nome
Cumprimentar com um bom dia 
Não é nada demais, é apenas uma boa sintonia

Quem dera se apenas uma face houvesse no mundo
Onde para se ter algo a mais
Ao outro não custe a própria paz
Onde o espírito da ganância seria
Apenas memória no tempo perdida

Talvez seja utópico dizer
Dos sonhos que desde ontem vejo acontecer
Talvez seja utópico esperar
Que um dia essa lama da água venha a se retirar

E finalmente todos possam vir a saber
Que da mesma água é que sempre estivemos a beber
Apenas mudaram as aparências do viver
Pra que um pouco acima eles possam parecer
Mas na verdade já os vejo naufragar
No próprio mar de discórdia que insistem em criar

Enquanto isso venho apenas dizer
Não corra tanto
Dias de paz em meio à luta
Serão feitos apenas por você

sábado, 13 de julho de 2013

Estrela Cadente



Estrela cadente
Desejo ardente
Pedido inocente
Na noite longa que se passa

Estrela cadente
Ouça essa pobre gente
Deixada pela maré do mundo
Ocupado demais em fazer girar tudo

Brilhe não apenas um momento
Seja luz na noite extrema
Quando minh'alma se sentir pequena
No céu do meus sonhos
Faça-os mais que meros delírios tristonhos

Ante a garganta que tem um nó
Desate essa emoção
Alivie o apertado coração
Que dessa vida ganha apenas um seco não

Estrela cadente 
Que de cima vê toda essa gente
Faça chover sua luz sobre essas cabeças
Lave com seu brilho
Dessa gente suas tristezas

Caia com um estrondo tamanho
Que cause ao mais duro ego
O mais sincero espanto
Mostre aos olhos cegos que não querem ver
Que para muito além de si eles devem se mover

sábado, 6 de julho de 2013

Passos, peneiras e escolhas



Caminhar. Enfrentar os rumos de um mundo estranho, e ver o porquê de termos chegado ao nível atual de degradação, seja ela ambiental, moral ou social. Entre os estranhos caminhos nos quais a vida nos lança, só mesmo com uma luz guia dentro do coração, para não se perder em meio a tantas possibilidades, tantas falsas verdades, tantas boas idéias, que só são boas para quem as tem.
Ainda que percorresse o mundo todo, não encontraria as respostas para todas as perguntas que tomam meu pensamentos. Ainda que entendesse todas as pessoas do mundo, não compreenderia porquê agimos assim. Ver estranhas conjecturas sobre um futuro impossível, um passado mal contado e já quase não existente nas memórias dos que vivem... 
Não basta caminhar. Sem rumo, nos passos se satisfazem com qualquer chão que tocam, e não necessariamente trata-se de um caminho. Algumas vezes são apenas ruas sem saída. 
Não basta apenas ver como o mundo funciona. Não basta se contentar com a atual realidade, e esperar que ela funcione. Muito aceitar tudo que é feito, pois nem toda ação é válida. É preciso entender que os fins não justificam os meios, e que nos olhos do outro vemos não apenas um reflexo de nós mesmos, mas também uma chama que não deve nunca ser apagada. Não temos esse direito. 
Por fim, ao sair pelos rumos incertos desse mundo, precisamos saber de uma coisa: nem tudo aquilo que vemos, por mais belo que possa parecer, é necessariamente o que devemos aprender.   

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Sobre os porcos e a morte



Antes do fim
Antes de mim
Antes de ti
Antes de vir

Arte prosaica
Uma vila arcaia
Palavras que são soltas
Ou apenas muitas ideias revoltas?

Crescente em mim
Advindo de ti
Abandono sem fim
Anseio por um sim

Calam-se os canhões
Estremecem os portões
Atrás das muralhas anseiam as mães
Pois sabem que já não mais bastarão os pães
Cerco envolto
O mar está revolto
Sombras e luzes numa dança estranha
Os tiros são vozes em uma só companha

Ladrilhos arrancados
Espelhos quebrados
Sonhos findados
Desejos usurpados

Caem castelos
Sobem novos reis
Rotaciona o campo de escravos
Chegamos agora ao número três

Se são porcos ou homens
Já desisti de saber
Vejo que nos rios matam as fontes
Sim, de sede eles vão morrer

Há quem ache que tudo é só uma pirâmide
Uma beleza profundamente cruel
Enquanto a ponta admira o mundo todo
A base foi feita para nunca ver o céu

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Sons no jardim



Apenas cinco minutos a escutar uma boa música
Sentado nas pedras de outrora
Poetizando a própria poesia
Enquanto as notas correm no ar
Mar...
Que logo ali quebra na praia
Com seu baque surdo
Trazendo a lembrança de que há ainda muito mais
Mata a respirar
Por onde circula o vento vivo
Carregado de cantos, histórias, memórias
Ao longe uma flauta soa, solitária em sua própria melancolia
Enquanto ao meu lado ressoa uma gaita
Chora os sentimentos perdidos dos apaixonados
Escrevo sobre a vida
Pois ela está em meu redor
Ela está aqui
Enfim, posso dizer
Que ela, serena como deve ser
Se encontra agora dentro de mim