quinta-feira, 31 de julho de 2014

Outras versões



Face triste, olhos marejados
Decepção, grito solto pelos espinhos farpados
Entrega ao reflexo de si mesmo
Que brilha na superfícia da água do lago
Enquanto os soluços enchem a noite
A sua própria dor é o único afago

Perdão que nasce no meio da escuridão
Enquanto convertido em angústia
Seu amor jaz pelo chão
Busca por respostas infindável
Num ritmo contínuo, essa tortura interminável

Cuidado ao abrir as portas do lar
Por trás de faces ternas
Estão intenções que mal se pode imaginar
Lá fora o mundo pode dar voltar
Mas aqui dentro, tal qual em minuto eterno
Parece que o tempo para sempre parou

Dúvidas que destroem a fé no amanhã
Dúvidas que quebram os quadros belos do que foi o ontem
Tornam cada fé no porvir em cinzas, resto de uma ideia vã
E tal qual ecos em uma montanha, as palavras vêm e vão na mente
Em um diálogo horrendo consigo mesmo

Quem se é não é certeza mais
E à noite deitado na solidão
Vem o pesadelo de que não foi mesmo verdade
Por não querer crer na história dos livros da sua mente
Sonha com uma realidade diferente
Aceitando ser mesmo de tudo o vilão
Que largou o amor por quem se simplesmente era
Por amar demais quem poderia ser
Ainda que fosse o único solitário
Que este outro panorama pudesse ver

sábado, 26 de julho de 2014

A doença do estranho cômico


Passar pela infância e adolescência é algo muito bom e, ao mesmo tempo, doloroso. Na nossa sociedade, pelo menos, latina, descendente de várias raças, há sempre julgamentos para tudo. Meninos que estão afeminados demais, meninas que estão masculinizadas demais, a imposição da felicidade a dois, porque quem está sozinho não pode ser feliz, dentre outras mil coisas mais. Um exemplo muito simples disso é ir a uma festa de amigos que se dizem próximos. Se uma música começa a tocar, e alguém se atreve a dançar sem saber, é o motivo de piada do dia. Porque temos de apresentar ao menos um mínimo de "proeficiência", se não quisermos ser o bobo da corte real. 
E assim é o nosso dia-a-dia. Roupas que não podem ser estranhas demais, posturas que não podem fugir do padrão, detalhes e mais detalhes que pesam como uma carga absurda sobre nossos ombros. Nós, de tão acostumados, não nos damos conta de como é doloroso suportar isso tudo. Não, não podemos ser nós mesmos. Ou melhor, se formos, somos encaixados em algum rótulo, porque não aprendemos ainda a viver sem julgar. Rotular é dar uma marca, porque sentimos a constante necessidade de avaliar os outros ao nosso redor. Não aprendemos ainda a ver as pessoas, seja na rua, na escola, ou dentro de casa, sem querermos avaliar, a partir de mera observação instantânea, o que aquele indivíduo é. Não. Precisamos vê-lo, avaliá-lo, dizer a qual prateleira ele pertece e, se for digno o suficiente de IBOPE, vale até uma foto ou um vídeo pra espalhar na internet. Nos damos o direito de classificar até mesmo as pessoas mais próximas, porque não entendemos a verdade de que a limitação está em nós.
"Nossa, que papo de humanista filosófico chato." É, talvez. Lendo apenas este texto, talvez seja mesmo um rótulo que justo. Mas honestamente, não importa. Não é um texto avulso, em meio a um blog inteiro, que é apenas uma das atividades que um indivíduo executa, que vai definir tudo que ele é. Não muda o fato de que, independente de qualquer característica superficial que seja vista ou atribuída ao ser, o caráter, a personalidade e sua definição (se é que ela é realmente palpável ao nosso olhar limitado) vão muito além, sendo ao mesmo tempo o conjunto e seus elementos individuais. E, em se tratando de uma sociedade que se baseia em rótulos, manchetes e boatos para tomar decisões e formar suas opiniões, não é de se surpreender que a mesma seja errônea e injusta quando se trata de conviver com outras pessoas. Chega a ser engraçado e triste ver as dicas de como melhorar a beleza e a auto-estima que circulam por aí. Elas se tratam, basicamente, de melhorar a superfície a fim de agradar conhecidos e desconhecidos que encontramos no cotidiano, para não darmos motivos de sermos a piada da vez. 
Não buscamos melhorar nossa compreensão do ser humano. Sua complexidade, dinamismo e, principalmente, sua mutabilidade com o tempo. Qualquer tentativa de dar uma denominação a isso é restringidora. É por isso que nos sentimos tão incomodados com estereótipos. Por isso sentimos que eles nos diminuem. Porque eles não são capazes de retratar tudo aquilo que somos. Servem apenas como tentativa para entender o que está na nossa frente, dividindo e classificando, assim como fazemos com tudo. A gordinha, o magrelo, a machona, o viadinho, o favelado, o hipster, o chato dos direitos humanos. No fundo, nos falta o hábito de olhar o mundo e as pessoas nele como um todo. Vemos a parte mais fácil, a que nos interessa, ou a que servirá para a próxima piada do show de stand-up. O que importa é manifestar ter uma opinião, seja ela qual for. Ficar calado, se abstendo de um posicionamento avaliativo e desnecessário sobre como o outro é, é ser passivo, ignorante, desinteressado, ou como dizem por aí, aceitar qualquer coisa que o mundo oferece. Perdemos o hábito, se é que algum dia o tivemos, de buscar compreender o outro a fundo, além daquilo que é superficial. E isso talvez porque, no final das contas, nós não tenhamos vontade de olhar para dentro sequer de nós mesmos.

segunda-feira, 21 de julho de 2014

Diálogo


Se encontraram. Um havia já externalizado seu pensamento. Irônico, sarcástico, baseado em leituras de manchetes, que não informam toda a notícia. Comentou, baseado em seus conceitos anteriores, já definidos com base naquilo que aprendeu ao longo da vida. Se informar? Não, eu acho que isso é assim, e pronto.
O questionador. Apresenta suas ideias, emaranhadas em agressões com relação à capacidade mental do interlocutor. Agressivos, eles começam a se estranhar, trocando tiros carregados de rótulos. Quem conseguir empacotar o outro, para vendê-lo como um produto descartável no mercado das ideias, ganha. Porque o que importa não é debater sobre sobre quem está certo: o que importa é provar que o outro está errado, massacrando-o e provando como ele é inferior intelectualmente. Um conservador, atrasado, ridículo, reaça. Um libertino, depravado, esquerdista. Opiniões? O que significa essa palavra mesmo?
Argumentação é sinônimo de perda de tempo. Educação é um princípio básico esquecido e guardado apenas para os que demonstram ter a mesma opinião. Pluralidade de ideias? Não! O mundo está dividido entre bem e mal, e esse mal precisa ser erradicado, humilhado, destruído e tornado em pó. Se o outro pensa de uma forma que não é a própria, isso não agrada, ofende, é crime.
Se o outro possui uma conduta diferente da que se vê como normal, ele é um destruidor da ordem. Ou um mantenedor de uma ordem opressora, mantida por guardas do leão real, preguiçoso, gordo e arrogante. O que ambos os lados esquecem, é que estão lidando com pessoas. Pessoas que têm ideias, limitações, defeitos, qualidades, e também receios. E, principalmente, ambos os lados esqueceram, ou sequer aprenderam, o que é, de fato, a atitude de dialogar. Talvez ainda precisem aprender que, ao tomar a decisão de mostrar a um terceiro um novo ponto de vista, não se faz isso destruindo o que ele já tem como sólido. É como um engenheiro contratado para reformar uma casa, chegar quebrando todas as paredes, sem apresentar um novo projeto de construção. Aquilo será visto como um ataque, e não como algo bom. Porque ninguém gosta de ver suas bases sendo ridicularizadas e jogadas pelo chão. 
A verdade é que boa parte dos conflitos do mundo, tanto atuais quanto os já passados, poderiam ter sido resolvidos de outra forma, se a arrogância em se mostrar superior não fosse o mandatário das nossas falas. O tom alterado e provocativo só pode ter uma consequência: a violência. Seja ela verbal, ou em casos mais extremos, fisica.

sexta-feira, 18 de julho de 2014

Ciclos



Mais um quilômetro
E a poeira que seca a garganta 
As rodas giram no asfalto
Cada vez mais poeira se levanta

Ao redor desta estrada
Vi campos, vi desertos
Vi o cume de uma montanha enevoada
Vi os segredos da natureza à noite despertos

E assim a vida segue com uma surpresa em cada curva
Com o tempo a gente aprende
Que mesmo nos caminhos retos não se consegue ver o fim
Pois mesmo quando a estrada segue sem desvios
O destino se curva sobre si

Sem anseios, sem pressa ou temor
Confiando em cada nuvem que tapa este ardente sol
Sabendo que mesmo nas noites escuras o mundo não perde a cor
Em estradas infinitas que se seguem
E assim como um rio umas nas outras se desembocam

E enquanto saudade e amores vão ficando para trás
Sei que no coração as memórias se perdem jamais
E as lágrimas que hoje molham os olhos
Serão orvalho para as flores do dia do reencontro
Até lá elas serão nuvens no céu
Indicando que o azul também combina com branco e cinza

Assim como o vento que vai assobiando e agitando os cabelos
Constante como o movimento que se entrega o espírito
Trás da praia o velho conhecido cheiro do mar
Onde as gaivotas eternamente dizem adeus
E perdidos marinheiros de volta a casa tornam
Para mais uma vez abraçarem os seus

terça-feira, 15 de julho de 2014

Super-heróis

 
Salvar vidas diariamente. Usar seus dons especiais para fazer com que o mundo seja um lugar melhor para se viver. É isso que aprendemos desde criança a respeito dos super-heróis. Que eles são pessoas super-poderosas, capazes de salvar pessoas de prédios em chamas, deter vilões mesquinhos possuídos pelo mal absoluto, em uma representação daquilo que temos de pior em nós mesmos.
À medida que vamos crescendo, porém, vemos que aquelas histórias, assim como na vida real, são repletas de dúvidas, inseguranças, questionamentos e, que no final das contas, o maior super-poder que um herói pode ter é o que ser destemido. Arriscar seu próprio coração, numa jornada combatendo tudo aquilo que nos arranca lágrimas. No final, vemos que eles são apenas humanos, numa representação daquilo que gostaríamos de ser: um pouco mais nobres e poderosos. 
Mas a verdade é que, em meio às suas identidades secretas, eles nos mostram uma lição preciosa: no nosso dia-a-dia é que estamos em meio ao mundo no qual precisamos intervir. Não é sendo justiceiros alheios à realidade do mundo, que iremos transformá-lo em um lugar melhor. É nos expondo a ele, convivendo com as pessoas, e entendendo seus dramas e conflitos, que iremos ter a capacidade de ajudar a quem quer que seja. E, por mais fortes que tentemos ser, mesmos os grandes heróis que criamos em nosso imaginário uma hora precisam de ajuda. Assim somos nós. Ser um herói, no final das contas, não tem a ver com ser invencível. Ser um herói tem a ver com não se importar consigo mesmo, desde que isso traga aos outros um pouco mais de luz para aquecer esses dias frios em meio a uma realidade tão crua. Expôr o próprio ser em meio a tantas adversidades a princípio pode parecer loucura. Mas é na loucura que aprendemos o vaor de uma vida e, quando aprendemos qual é o valor de uma vida, a loucura se torna a nossa razão de viver cada dia desta existência, porque o sorriso estampado no rosto de quem teve o dia salvo vai além do que este mundo pode explicar. É o céu prometido, expresso em uma simples face, que dá força para vencer o nosso maior inimigo: nós mesmos. São olhos dantes famintos, que ao ver que neste mundo ainda há sal para dar gosto à vida, se enchem de lágrimas, por saberem que a esperança não morreu. Ela apenas vive latente em nossos corações.

quarta-feira, 9 de julho de 2014

Quanto custam os sonhos



"Sonhar é de graça." 
"Sonhar não paga imposto." 
Isso é o que dizemos todos os dias, enquanto fazemos nossos planos ditos como que quase irrealizáveis a respeito do nosso futuro. Mas a verdade é que, antes de dizer isso, é sempre bom repensar e refletir nas palvras que proferimos.
Fazer planos a respeito da própria vida pode ser tudo, menos de graça. Porque nem todo custo dessa vida se mede em cédulas ou moedas. Sonhar nos leva a nos movermos e, ao nos movermos, passamos por experiências que podem ser boas, ruins, que podem nos fazer sofrer, ou até mesmo nos fazer querer voltar atrás. Sonhar é ter de conviver a todo momento com cada uma das próprias limitações, buscando em meio a elas uma saída para se chegar até onde se quer.
É, basicamente, abrir mão do conforto de uma vida sem grandes mudanças, em meio a todos aqueles que se ama, no lugar que se ama. Sonhar é isso, é ter de se desapegar a todo momento daquilo que você gosta, que te faz sentir confortável, e partir em outras direções. É sofrer sozinho, encontrar novas pessoas durante a jornada, se despedir delas e, algumas vezes, é também ter de desistir. 
O mais doloroso em sonhar, é se confrontar com aquilo que se é. Suas limitações que te prendem ao lugar onde está, e muitas vezes a incapacidade de superar todas elas. Sonhar é aceitar que o mundo é mesmo muito grande, tentar se encontrar em meio a ele, e no final não caber mais em si mesmo. É batalhar, perder, vencer e, o mais importante de tudo, crescer. Persistir quando tudo estiver ruindo, e acreditar em si mesmo quando ninguém mais o fizer. Porque no fundo, só nós mesmos é quem conhecemos nossas limitações. 
Continuar todos os dias é uma questão de decisão. Por mais clichê que possa soar, quando uma porta se fecha, outras se abrem. É uma questão de querer ver onde aquelas que estão abertas se encontram. Não se perder da própria essência, e nem daqueles que contigo estão é o que faz os caminhantes chegarem ao seu destino. Resistir a tentadoras pousadas durante a jornada também faz parte do caminho, e a verdade é que no final descobrimos que o único e verdadeiro teto que nos abriga é o céu de uma noite estrelada, onde cada ponto de luz ouve nossos anseios.
Até que, lá na frente, quando a sua jornada acabar, e você descobrir que existem muito mais caminhos para se percorrer, e novos sonhos pelos quais lutar, e surgirem aqueles que compartilham desta até inocente opinião, você será capaz de ver, entender e não mais esquecer o quanto sonhos, definitivamente, não são são de graça.