quinta-feira, 25 de julho de 2013

Sobre necessidades e milagres com rótulos


Acordou e sentiu de novo aquele mesmo desejo. Foi até a geladeira, pegou uma garrafa com um líquido negro, que não tem sabor de nada conhecido, e bebeu. Ahhhh! Ops. A vontade continuou. Bebeu mais, até o fim, mas não adiantava. Decepcionado, resolveu ligar a televisão. Lá viu a promessa de um produto que poderia satisfazer o seu desejo. Ótimo! Tudo que ele precisava. Pegou as chaves em cima da mesa, e partiu com o carro. Foi até o mercado mais próximo, e lá estava a promessa. Comprou e, logo que saiu, bebeu todo o conteúdo. Algo meio gasoso, com gosto e sem gosto, que nem de longe era o que ele procurava. Será que havia algo errado com ele? Pois parecia tão perfeito na TV...
Então, andando pela rua, topou com uma mulher, atraente em roupas chamativas, que tinha em mãos uma garrafa. Bebeu, sentiu o corpo despertar dos pés à cabeça, e sentiu que tinha energia para o dia todo. Isso sim era bom. Era da moda, inclusive. Se sentiu jovem, descontraído. E logo veio a vontade de mais, porque descobriu que seu desejo nem de longe tinha sido satisfeito.
Ficou irritado, e o corpo pedindo cada vez mais. Puxando a gola da camisa, pensou em como estava quente. "Que dias difíceis", pensou. "Já não se encontra nada com qualidade." Continuou na sua jornada, sempre encontrando mais explicações para seu desejo, cada vez mais bem elaboradas. Em uma delas, inclusive, ele devia ter algum distúrbio no organismo, e lhe propuseram um milagre engarrafado para lhe ajudar. Mas ele preferiu continuar caminhando.
Então, ao meio do dia, sentado na praça, ele a viu à sua frente. Barulhenta, brilhante, aos montes se espalhando dentro do grandioso recipiente de concreto. Foi até e provou. A não presença de sabor, o toque gelado, fez seu corpo enviar reflexos de descanso e satisfação. Naquele momento ele viu que não era falta de energia, tampouco um distúrbio. Era apenas, pura e simplesmente, sede. Sentindo-se ao mesmo tempo bobo e aliviado, sentou-se no banco à sombra, a aproveitar o dia que, como ele sentiu pela brisa que vinha das árvores, na verdade não estava tão quente assim.

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